Espectroscopia IRMPD

Introdução

No âmbito do estudo de intermediários de reação, a espectrometria de massas, principalmente com ionização por eletrospray, trata-se de uma técnica bastante útil, uma vez que é possível extrair intermediários reativos presentes na solução intactos para a fase gasosa. Isso feito, pode-se caracterizar a espécie iônica por sua razão m/z, com o auxílio, também, de técnicas de fragmentação, como CID (“Collision-Induced Dissociation”), que proporcionam mais informações a respeito do padrão de quebra do íon. Não obstante, apenas com a relação m/z, não se é capaz de diferenciar isômeros ou confôrmeros de uma espécie de interesse.

É no contexto supracitado que se insere a espectroscopia vibracional de íons por dissociação multifotônica no infravermelho ou, resumidamente, espectroscopia IRMPD. Por meio dessa técnica, torna-se possível, apesar da baixa densidade de íons nos analisadores de massa, registrar o espectro infravermelho de uma espécie isolada no espectrômetro, o qual pode conter um vasto número de informações a seu respeito.

Princípios da técnica

Devido à baixa densidade de íons com que se trabalha nos espectrômetros de massas, não há absorção de radiação suficiente para determinar o espectro infravermelho. Por conseguinte, para alcançar tal objetivo, faz-se uso da espectroscopia de ação, que consiste em medir o efeito produzido pela radiação absorvida no sistema em estudo em vez da absorbância em si. Nesse caso, o que se detecta é a dissociação dos íons irradiados; como esta é proporcional à absorção, registrando a constante de dissociação em função da frequência da radiação, obtém-se o espectro vibracional da espécie.

Para fragmentar os íons, contudo, não basta a absorção de um fóton. Múltiplos fótons devem ser sucessivamente absorvidos e sua energia, redistribuída pelos modos normais de vibração (IVR – “intramolecular vibrational redistribution”) até que a energia interna atinja o limiar de dissociação. Faz-se, pois, necessário, como fonte de radiação, um laser possa gerar pulsos monocromáticos com frequência capaz de variar continuamente na região do infravermelho. É possível obter isso com lasers de elétrons livres (FEL) e osciladores paramétricos do tipo OPO/OPA: o primeiro opera com alta potência entre 800 e 2000 cm-1, enquanto o segundo gera radiação na faixa de 2000 a 4000 cm-1.

Vale, também, citar que, em casos em que a potência da radiação não é suficiente para fragmentar a espécie de interesse, faz-se uso do laser do CO2, que, ao ser utilizado em uma frequência fixa em conjunto com o OPO ou o FEL, facilita a fragmentação. Esse geralmente é o caso para o OPO, que proporciona um feixe bem menos intenso que o FEL.

Ao se utilizar, portanto, um espectrômetro de massas no qual seja possível isolar um íon específico e mantê-lo aprisionado – por exemplo, ion trap ou FT-ICR –, apenas uma modificação para que o laser entre na armadilha de íons é necessária para a realização da espectroscopia. A partir disso, registra-se a intensidade dos íons-filho e íons-pais com o tempo, concomitante à variação da frequência do laser. Transformando o eixo x de tempo para frequência da radiação, obtém-se o espectro vibracional.

Uma vantagem da espectroscopia de íons em fase gasosa é a facilidade de comparação com cálculos teóricos, uma vez que efeitos de solvatação e de interações intermoleculares não influenciam no espectro IRMPD. Sendo assim, se se está em dúvida entre duas conformações, calcula-se o espectro vibracional teórico dos dois e compara-se com o obtido experimentalmente. Esse estudo pode ser importante sobremaneira para descobrir a estrutura de um intermediário de reação e saber, por exemplo, como os reagentes de uma determinada reação se ligam ao catalisador.

Por último, cabe salientar que IRMPD, sozinho, trata-se apenas de uma técnica de fragmentação, na qual a absorção de diversos fótons leva a fragmentação de íons no espectrômetro de massas. Com a relação m/z dos fragmentos, é possível obter mais informações da espécie estudada, bem como usar o fragmento para uma outra reação de interesse. Somente se esta técnica de dissociação é acompanhada da variação contínua da frequência do laser e do registro concomitante da constante de fotodissociação é que se está falando da espectroscopia IRMPD.

Referências

[1] VALLE, J.J.; EYLER, J.R.; OOMENS, J.; MOORE, D.T.; VAN DER MEER, A.F.G.; VON HELDEN, G.; MEIJER, G.; HENDRICKSON, C.L.; MARSHALL, A.G. e BLAKNEY, G.T., Rev. Sci. Instrum., n. 76, 023103, 2005.
[2] MACALEESE, L. e MAÎTRE, P. Mass Spectrometry Reviews, n. 26, p. 583-605, 2007.
[3] Página da web do Centre Laser Infrarouge d’Orsay (CLIO): http://clio.lcp.u-psud.fr/clio_eng/clio_eng.html
[4] ROITHOVÁ, J. e MILKO, P., J. Am. Chem. Soc., 2010, 132, 281.