Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Bioinformática ganha Prêmio USP Mães Pesquisadoras 2025

Realizado anualmente, o Prêmio USP Mães Pesquisadoras tem como objetivo reconhecer o trabalho científico desenvolvido pelas mães da Universidade de São Paulo em diferentes etapas da vida acadêmica: docência, pós-doutorado, pós-graduação e graduação. A área temática escolhida para a edição de 2025 foi a de Ciências Agrárias e Ambientais – e a doutoranda Janaina da Silva Fortier, aluna do Programa Interunidades de Pós-graduação em Bioinformática, foi vencedora na categoria de pós-graduação. 

Janaina começou sua vida acadêmica quando saiu da casa de sua mãe, em São Paulo, e mudou-se para Piracicaba. Lá, graduou-se em Ciências Biológicas na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ). Engravidou durante seu mestrado, realizado no Instituto de Biociências da USP, e teve que aprender a conciliar sua carreira com a vida pessoal. Hoje, Janaina é doutoranda de um Programa Interunidades sediado no IQUSP. “É importante ter prêmios como esse para exaltar o trabalho da mulher, porque tanto o ambiente agrícola como o acadêmico tem muita valorização do trabalho do homem. A ESALQ era um ambiente machista. Onde você ia, os professores eram homens; eles eram a maioria”, relata a pesquisadora.

Pesquisas e meio ambiente

“Meu foco na área da Biologia sempre foram as plantas. Na graduação, fiz estágio na parte de mudanças climáticas e também com educação ambiental – em escolas da prefeitura, na parte de biorremediação”. Janaina conta que, desde quando entrou na faculdade, já sabia que queria ser professora universitária. Então, logo após apresentar seu TCC sobre o impacto das mudanças climáticas na produção da cana-de-açúcar, seguiu o caminho natural – retornou a São Paulo e ingressou no mestrado.

A pesquisadora explica que o desafio de sua pós-graduação foi tentar preencher uma lacuna na literatura sobre o impacto das mudanças climáticas na vegetação diante do clima tropical. “Existem muitas pesquisas quanto ao clima temperado, mas os trabalhos sobre o tropical estão publicados em literatura cinza ou são artigos em espanhol e português, o que reduz o acesso”. Em seu estudo, ela fez uma análise estatística com os trabalhos nesse tema – e, assim, conseguiu verificar especificamente o impacto das mudanças na vegetação dos biomas brasileiros.

Atualmente, Janaina está na metade de seu doutorado e pesquisa sobre as relações das mudanças climáticas com a insegurança alimentar. Devido ao aquecimento global, se faz necessário um aumento na produção mundial de alimentos; porém, é importante garantir que isto não agrave a emissão de gases de efeito estufa, de forma que a solução não é expandir a área de cultivo, mas aumentar a produtividade. Ela explica que os efeitos extremos, como altas temperaturas e secas, têm afetado as plantações – e busca entender como mitigá-los em sua pesquisa.

“O Brasil é o líder mundial na produção de soja, representando 39% do cultivo. Então, no laboratório a gente começou a fazer experimentos em câmaras, onde injetamos CO2 e simulamos cenários do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas)”. A doutoranda conta que, a partir da análise desses experimentos, ela observou uma perda de até 91% desses grãos de soja – com consequências como o aumento do ácido oleico, que deixa o insumo impróprio para consumo. “Eu faço uma análise histórica desses efeitos (...). Estou na etapa de analisar o genoma da soja para tentar identificar quais são os responsáveis por esses efeitos e o que poderia torná-la mais resistente a essas mudanças.”

Maternidade no ambiente universitário

Janaina conta que o período de maior incerteza em relação ao futuro foi durante o seu mestrado. Mesmo com a gravidez, ela continuou ativa até o último minuto: “lembro que, na época, eu e um amigo do IME (Instituto de Matemática e Estatística da USP) decidimos organizar um curso de inverno sobre hortas inteligentes, no qual os alunos tinham que desenvolver uma irrigação automática com placas de arduino. Dei o curso até sexta-feira e, quando foi na segunda, meu filho nasceu, no próprio Hospital Universitário”. Ela também destaca a importância dos primeiros meses de maternidade, em que pôde se afastar de suas demandas sem parar de receber a bolsa de sua pesquisa. “Também lembro quando voltei, que tive que escrever a minha dissertação ali, com o computador em uma mão e amamentando ele na outra”, relata.  

“Eu sempre soube que queria seguir a vida acadêmica, mas ela demora muito para ter um retorno financeiro. Quando fiquei grávida, meu esposo estava desempregado. Então, a gente passou por uma situação bem difícil. Me fez questionar se era aquilo mesmo que eu desejava, porque é uma carreira que eu gosto, mas que não estava conseguindo me dar sustento e nem fornecer as coisas básicas para meu filho”. Apesar das dificuldades e com o apoio de sua família, Janaina optou por continuar com sua dissertação de mestrado e seguir seu sonho. Ao finalizar esta etapa acadêmica, começou a dar aulas em uma escola pública – onde conseguiu o sustento que a permitiu desenvolver seu projeto de pesquisa para o doutorado.

O primeiro desafio se apresentou já na prova para ingresso no doutorado. Ela conta que, na mesma semana, seu filho Gabriel estava passando mal e foi internado. Preocupada e sem foco, Janaina não conseguiu a aprovação no processo seletivo. “Naquele momento, eu pensei: ‘terminou, né?’. Mas também ficava pensando: ‘para que área eu vou então?’. Não me via numa empresa trabalhando. Tive oportunidades, mas não é algo de que eu gosto. E então, saiu o resultado da FAPESP – meu projeto foi aprovado (...). É algo difícil, principalmente quando você submete um projeto assim, isolado. Fiz a prova de novo e, dessa vez, passei”.

A pesquisadora relata que essa experiência toda trouxe novas perspectivas para o seu desenvolvimento profissional. “Passar por essa dificuldade durante o mestrado ressignificou o meu fazer acadêmico. Não vejo mais só como uma pesquisa focada ali em um tema, mas no futuro mesmo – não só do meu filho, mas das próximas gerações. Então, eu penso em trazer esse conhecimento para a população de forma que possa trazer esperança”, conta Janaina.

Apoio 

 Janaina enfatiza que, apesar da instabilidade durante seu mestrado, hoje as coisas melhoraram e estão menos difíceis. “A bolsa da FAPESP me permitiu uma condição de vida melhor. O Gabriel fica na escolinha pré-infantil da USP – ele fica ali todo dia, em período integral, e isso é uma conquista que os alunos do passado conseguiram. Isso me ajuda e, assim, eu consigo dedicar mais tempo à minha pesquisa”.

A doutoranda ainda comenta sobre como observa, cada vez mais, iniciativas na universidade que dão suporte às mães – e que validam a ocupação de mulheres nos espaços acadêmicos. Ela cita como exemplo o Programa de Aperfeiçoamento de Ensino (PAE): um modelo de estágio acadêmico da USP, oferecido aos alunos matriculados nos programas de mestrado e doutorado que buscam aprimorar a sua formação didática. O programa estabeleceu uma cota semestral de 100 bolsas, direcionadas às pesquisadoras mães inscritas no Estágio Supervisionado em Docência nas diversas unidades da USP.

Janaina ainda tem mais dois anos para completar o doutorado – e muitos planos e ambições para o futuro de seus estudos. Porém, precisa lidar com os conflitos pessoais sobre como equilibrar sua carreira com a maternidade: “mãe nunca está focada 100% no trabalho. Eu sempre penso que, se eu conseguir um projeto no exterior, por exemplo, será que meu filho vai se adaptar?”.

 

Por Isabella Gargano | Comunicação IQUSP

Data de Expiração: 
01/01/2030